sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Concrecoisa Folha de Papel



Uma memória em folha de papel pode ser entendida como uma história adormecida no aguardo de manuseio.

No mundo dos objetos, a folha riscada de papel guarda em si o rastro do tempo. 

A própria folha de papel já é rastro do tempo de sua criação.

Aqui na concrecoisa, o rastro no papel é o desenho de Miguel Cordeiro. 

Riscos e rabiscos feitos em 25 de janeiro deste ano de 2014. 

Foi um sábado de papo, na Ceasinha do Rio Vermelho, em Salvador, na Bahia, no encontro informal do Grupo de Inteligência Política (GIP).

A política no GIP não é a carcomida política partidária, vale ressaltar. 

É a política no sentido filosófico, no sentido lato de ser.  

O encontro de amigos para conversar sobre o que der na cabeça de cada um agora é registro.

Agora é memória viva numa folha de papel.

No desenho do artista grafiteiro e narrador de si, pela ordem, a partir do próprio, com boné, no sentido horário, eu, Pacheco Maia, Flávio Novaes e Anibal Gondim.

Sobre este instante de amizade, digo: 

minha memória
revive em traço
numa folha de papel
e o passado congelado
é a fantasia na história 

Agora, mais do que nunca, o rastro na folha de papel ganha outra dimensão: a cibernética.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Concrecoisa Traça



Era uma vez uma traça.

Ela vivia na biblioteca pública passeando por entre os livros.

Ela amava as obras clássicas.

No setor de filosofia, se deliciava com os filósofos gregos, preferindo Sócrates e irritando-se com os sofistas.

Gostava também de outros filósofos, como o dinamarquês Kierkegaard e o alemão Nietzsche.

Certo dia, uma traça que não lia soube da boca de outra traça que se uma traça fraca tomar veneno, pouco a pouco e em dose não mortal, o veneno tornar-lhe-á mais forte.

Assim fez a traça que não lia, que passou a lamber as naftalinas da biblioteca.

Começou com uma lambidinha medrosa, passando para duas, três e assim por diante.

Só que um dia, se achando poderosa demais, a traça que não lia abusou da lambida e acabou mordendo um pedaço da bolinha de naftalina.

Morreu em poucos segundos.

A traça mais velha, aquela que passeava por entre os livros e lia tudo com aprofundamento e interpretava o que estava nas entrelinhas, disse repetidas vezes para uma traça jovem que iniciava a vida.

– Traça feliz não come naftalina.

– Traça feliz não come naftalina.

– Traça feliz não come naftalina.

– Traça feliz não come naftalina.

– Traça feliz não come naftalina.

...

Tempos depois, já bem velhinha e no leito de morte, a traça que aprendera que “traça feliz não come naftalina” pediu como último desejo comer um pedacinho da bolinha de naftalina.

Em segundos, vendo que antecipara a morte, nas últimas palavras, disse para todas as traças que estavam ao seu lado:

 – Traça feliz só come naftalina no seu último desejo.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Concrecoisa Transalma

As almas dançam.

Cada uma no seu estado odara.

Talvez um odara cantado por Caetano Veloso.

Talvez um odara projetado na fé do povo vestido de branco em louvor ao Senhor do Bonfim, em Salvador, na Bahia.

Ali está o estado odara; no acreditar de cada um.

No transe...

Na alma...

No estágio transalma...

Um odara transcendente que nasceu em José Jesus Barreto.

O odara no eu dos muitos us.

Vários eus num só!

Um eu na simples observação do desprezível ou no som que faz a alma acordar para dançar, como eu disse na primeira linha deste texto que termina sem jamais terminar.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Concrecoisa Sonho


Feliz é quem sonha.

Eu sonho em ganhar uma boa grana na loteria para viver num cantinho de tranquilidade fazendo fotos, concrecoisas, jogando xadrez, compondo e plantando hortaliças no quintal de casa.

Tudo, de preferência, numa cidade do interior e com uma temperatura bem fria.

Em conversa com um passarinho (um cardeal) – que pela manhã canta na janela do quarto do meu apartamento dando-me bom dia – ele cochichou que o sonho dos pés é o sonho de voar.

Ele com o seu canto de liberdade assegurou que o chão é o veneno onde jorram as maldades do mundo.

Em seguida, ele voou para o seu ninho, numa amendoeira bem perto do meu prédio.

Chorei mais uma vez com o encontro que se repete às manhãs...

O mais legal de tudo isso é que o passarinho, o cardeal, me mostrou que o seu voo encantador é um presente da natureza para viver em paz.

Voa, voa passarinho...

Voa que o ar é o chão da plena liberdade!

E você que acaba de ler este texto da concrecoisa, qual é o seu sonho? Diga-me, se assim desejar!       

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Concrecoisa Fragtempo


A jornada de cada um no fluxo do tempo é um fragmento.

E os pedacinhos vão formando o todo incompleto: há o porvir.

Desde o nascimento até o instante atual, a cola que cola os pedacinhos é o verbo.

E não adianta lutar contra a realidade do verbo no tempo e do tempo no verbo.

Num dia qualquer, o tempo de cada um se resumirá em memória.

Uns com muitas vivências para contar.

Outros com poucas, quase nada.

Alguns serão lembrados, até em excesso.

Outros esquecidos, inclusive pelos próximos.

Estes últimos, possivelmente, não sabem o motivo da própria existência.

São filhos do acaso, do descaso, do que der e vier.

Assim é a jornada do gozo...

Vivemos no
Fragmento
Do tempo
E o rastro
É o que é
Cada um

Assim é a lembrança.

Assim é, também, o esquecimento.