sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Concrecoisa Saudade


Estou lendo um livro de Osvaldo Orico, obra de 1940.

O título me chamou a atenção: “A Saudade Brasileira”.

É uma obra rara e belíssima.

Lá dentro, explicações, biografia da palavra saudade, pesquisas anteriores e poemas sobre esta palavra única, nossa, para nós que falamos português.

Achei esta passagem genial, anônima, logo na página 12:

“Sôdade é uma dô que dá,
Mas não é dô que doê;
É vontade de alembrá,
Com vontade de esquecê.
É dô de dente e machuca,
Mas onde dói ninguém vê.
E a gente pega e cutuca
Pra não deixá de doê.”

Vale ressaltar, ainda conforme Osvaldo Orico, que o trabalho ensaístico “A Saudade Portuguesa”, de dona Carolina Michaëlis, foi o começo de tudo.

O que Orico disse também vale para esta concrecoisa.

Tô indo!

Adeus 2013.

Feliz 2014.

A saudade de um passado de alegria, de coisa boa, de não sei lá o quê?, já começa a se movimentar em mim.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Concrecoisa Nelson Mandela


Noite de Natal.

A família Makbunto chora.

Na árvore de Natal, uma foto.

No lugar de presentes, velas acesas.

No choro sem fim, a saudade.

Jesus estava distante, muito distante.

Mas o mito da luta pela liberdade bem perto, mesmo distante.

Nelson Mandela estava ali, na foto, em cada um, na liberdade, na igualdade, na África, na luta e na paz.

A família Makbunto também reza.

E sonha que todos que nasçam no mundo sejam semelhanças de Jesus ou Nelson Mandela.

A esperança fez a família Makbunto ter força para encarar a dura realidade da vida, agora sem mãe, sem pai, sem Mandela.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Concrecoisa Olhe-me


O olhar estava lançado.

De todos os lados, ele vinha.

Numa noite, no escuro total, o olhar me acertou.

Procurei-o em desespero.

Não encontrei.

Quando o dia clareou, fui ao espelho.

Achei o olhar.

O olhar era eu.

Tomei um susto, não com o olhar, mas com uma voz

que ecoou do vazio silencioso...

– Me olhe olho.

Nesta hora, já não enxergava mais nada.

Era a felicidade que havia chegado.

E os dias seguintes foram cada vez mais felizes!

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Concrecoisa Certeza


Falar da certeza é falar do fim.
Assim, digo:

um
dia
o
fim
dirá
fim
para
algo
ou
tudo
de
cada
um

Tenho certeza que não preciso dizer mais nada.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Concrecoisa Concêntrico

Rengawaldo acordou irado.

Estava uma arara e bufava pelos cantos da boca.

O porteiro do prédio de Rengawaldo, ao vê-lo azedo do azedo do azedo, disse que, possivelmente, “a amada tinha dormido de calça jeans e o chefão puxado as suas orelhas”.

Para atenuar a amargura que sentia, antes de papear com a imprensa, Rengawaldo tomou um goró.

Pluft, plaft, boom: o astral mudou rapidamente.

Com a persona renovada, foi para o centro do poder, depois de driblar verborragicamente alguns focas da imprensa local.

O dia era de decisão, sem os outros saberem.

Tinha que escolher quem seria o cara ideal para ficar em seu lugar, no círculo das decisões futuras.

Já estava de saco cheio com tudo ligado ao poder e queria sombra e água fresca, nada mais.

A vida tinha que ser vivida!

O dileto Yuratsok, ao sacar que o chefe tinha tomado um goró para mudar o astral, ficou na moita, calado e sorrindo dissimuladamente.

Algo de bom estava para acontecer.

Era sempre assim!

Então Rengawaldo, na reunião com decisão inesperada, afirmou que o escolhido era Yuratsok.

Este, aliviado, gargalhou sem medo de repressão dos pares.

Assim, com a escolha antecipada e imperiosa, o centro do poder estava, teoricamente, concentricamente assegurado.

Rapidamente a reunião terminou.

Os pares que não gostaram da decisão de Rengawaldo foram chorar no pé do caboclo, no Campo Grande.

Os pombos daquela praça gostaram da piscina que se formara por conta do chororô dos preteridos.

À noite, o porteiro que dissera que “a amada tinha dormido de calça jeans e o chefão puxado as suas orelhas”, ao saber do ocorrido, ao saber da decisão de Rengawaldo, foi sábio, claro e direto: “Manda quem pode e toma goró quem tem prejuízo”.

E o centro concêntrico do poder circula no círculo agora fechadíssimo.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Concrecoisa Antropofagia

Fome, fome, fome... muita fome.

Fome de tudo.

Uma fome que deteriora o país.

Fome de poder.

Fome de vingança.

Fome de dinheiro.

Fome antropofágica.

Mas o tempo passa e a fome hiberna.

É a hora de cuspir.

E chove cuspe das bocas gulosas.

Bocas da corrupção.

Bocas que defendem a impunidade.

Bocas que cospem com vontade, depois de matar a fome nas tetas do Brasil.

Cuspe, cuspe, cuspe... muito cuspe.

Eles cospem para ter fome e para depois da hibernação comer mais e mais.

De quatro em quatro anos a fome indomada volta mais forte.

E os que não comem esperam um dia entrar na comilança.

E assim caminha o Brasil.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Concrecoisa Ou


A Concrecoisa Ou é uma singela homenagem a Walter Franco.

Ele (Walter) saiu com o “ou não” de forma musical, em 1973, num disco branco com a foto de uma mosca.

Walter Franco entrou para a história da música brasileira por causa deste e de outros trabalhos, sobretudo por causa de sua irreverência e inventividade.

Com o tempo, o “ou não” foi fisgado sabiamente por Caetano Veloso, que de tanto falar o “ou não” acabou apadrinhando a expressão walteriana.

Certa feita, num papo por telefone com Walter, ele me disse contente que Caetano tinha falado que o "ou não" era de Walter Franco.

Ao dar o crédito, Caetano Veloso ficou com crédito.

Acho que este crédito deveria ser mais e mais reverberado.

Todos ganham com a inventividade do outro e a história fica em sintonia com a verdade.

Aqui na Concrecoisa, o “ou” transita numa escada de “não” e de “sim”. São degraus onde a dúvida (o ou) pode subir ou descer.

Sim, ou não!

Não, ou sim!

Viva Walter Franco!


Ou não?!

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Concrecoisa Lugares

Estava no buzu.

Lá fora, o sol de lascar o couro de qualquer calango derretia o asfalto.

O suor escorria pelo cangote de todos.

Além do calor, a barulheira infernal convidava para descer no primeiro ponto.

Resisti.

A passagem estava cara demais para subir num ponto e descer no outro.

O salário mínimo não permite tal luxo!

Suportei em meditação.

Esqueci a situação quando me liguei num papo entre duas senhoras.

Uma contou para a outra que sonhou que estava passeando pela lua e era a primeira vez que ocorria algo desta natureza em sua vida já bem vivida.

A outra entendeu que ela estava passeando pela rua, dando vazão ao papo.

Depois de uns cinco pontos, a senhora que trocou lua por rua perguntou o nome da rua daquele sonho.

A sonhadora disse que conhecia apenas por lua, nada mais.

A ouvinte quase surda e agoniada e sem entender mais nada disse que vivera na Rua da Lua e tinha um velho ex-namorado que ainda morava lá.

A sonhadora achou que era gozação demais e partiu para dentro da outra, conhecida ali mesmo e há poucos minutos atrás.

Foi um arerê só e de arrepiar qualquer ser vivente.

O pega pra capar com um separa-separa agitou o buzu-sauna que circulava pelas ruas engarrafadas da velha Cidade da Bahia.

Pena que a confusão aconteceu no instante em que eu ia descer.

Até hoje fico a me perguntar se o problema foi a lua ou a rua.

Levei o assunto para um debate filosófico.

O mais sábio dos sábios assegurou que o problema foi causado pelo sol.


E num eclipse, a polêmica sucumbiu em silêncio e frio intelectual.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Concrecoisa Espalhe

Foram milhares de papeis jogados pelas janelas dos prédios.

Todos comemoraram a vitória!

– Que vitória...

Gritavam os irmanados vencedores.

Ele, o único vencedor. Único vivo de uma luta inventada pela mídia.

Porém, um inimigo não jogou papel picado, mas, sim, pétalas.

Isso causou ódio, um ódio muito estranho no único vencedor.

Diante do espelho, mandou o seu principal agente secreto encontrar este inimigo mortal e jogá-lo numa fogueira.

Ao encontrá-lo, gritou sarcasticamente.

– Não se espante rapaz, você é o nosso inimigo mortal por retirar as pétalas do jardim encantado e jogá-las em nosso líder!

Sabendo que ia morrer, o atirar de pétalas disse sem medo.

– Quem espia no ar as pétalas em meio à chuva de papel picado é um tirano inimaginável. Eu saio de cena para não ser o vilão da história, ou melhor, para não ser aquele que ficou do lado errado, do lado do espinho que restou no jardim da liberdade.

Assustado com a resposta, o agente não suportou a dor de estar do lado errado.

Aquele inimigo nunca fora seu inimigo, pois tudo naquele país não passava de uma mentira.

Em silêncio, o agente foi embora e disse ao tirano que a pétala era uma manipulação do sistema de inteligência e o inimigo não passava de uma ilusão.

O tirano aceitou o argumento.

E o jardineiro libertário, aquele atirador de pétalas, viveu em paz no jardim da liberdade.


E a palavra dita ao agente com coragem ainda ecoa, mesmo sendo uma palavra indesejada.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Concrecoisa Crepúsculo dos Ídolos


O Brasil debate a necessidade de autorização, ou não, para escrever uma biografia.

De um lado tem quem defenda a liberdade total de expressão e nesta perspectiva a garantia constitucional de escrever uma biografia sem precisar de autorização do biografado ou de seus herdeiros.

Do outro lado tem quem defenda a necessidade de autorização e a consequente proibição de biografia não autorizada. A base legal remete ao ultrapassado Código Civil.

A pendenga está para ser resolvida no Supremo Tribunal Federal e na Câmara Federal.

Quem é contra a biografia não autorizada busca argumento na invasão de privacidade. Também quer uma parte da grana da vendagem dos livros.

Eu defendo a liberdade total de escrever qualquer coisa, biografia de quem quer que seja, tendo, claro, o cuidado de ser fiel aos acontecimentos.

Nada de biografia chapa branca, endeusando vidas marcadas por imperfeições e que ajudam o leitor a se tornar uma pessoa melhor.

No meio da discussão, um grupo de artistas quer proibir a biografia não autorizada.

Roberto Carlos, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Chico Buarque, dentre outros artistas, defendem as biografias autorizadas.

Como são ídolos de muitas gerações, estes artistas não querem ver passagens de suas vidas mostrando o quanto são humanos, demasiadamente humanos, e com deslizes, defeitos, fraquezas, inquietações, dissabores, dentre outros temas que não desqualificam as suas obras.

Quem nunca teve um deslize na vida? Pergunto.

Do exposto, sem delongas, recorro a Nietzsche, em “Crepúsculo dos Ídolos”, para mostrar como são as vidas humanas.

Os que estão na discussão entram no ciclo crepuscular.

Nietzsche percebeu este crepúsculo criticando Sócrates.

Para quem já lutou pela liberdade de expressão num passado próximo e hoje defende a censura às biografias não autorizadas, fica a impressão que a luta de ontem e a de agora são circunstanciais, de acordo com interesses pessoais, e não por uma causa maior, uma causa coletiva, uma causa de todos e voltada para o futuro.

Seja o que seja decidido pela Justiça e pelos parlamentares, uma faceta do crepúsculo dos ídolos em questão já está presente na vida destas pessoas públicas.

“Nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam não”, já cantava Belchior em “Como nossos pais”.

Nietzsche tinha e continua tendo razão.

Fui convencido, me desculpe Jorge Mautner (apoiador do grupo citado), que me autorizou escrever a sua biografia, já lançada, em 2004.

Não sei o que está acontecendo com as cabeças pensantes deste país. 


Vale dizer que Jorge Mautner nunca censurou uma linha do que eu escrevi sobre ele.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Concrecoisa Escadaria

A escadaria serviu de assento.

O corpo cansado não suportou a dor do tempo.

Era preciso dar uma trégua à peregrinação.

Ao sentar, riu da vida que levava.

Era um riso de prazer.

Era um riso de grito, de esperança, de silêncio!

Sim, riso de silêncio interior.

Também era um riso de criança em corpo de velho.

Não era um riso de mentiroso, tinha esta convicção.

Mentiroso ao estilo dos ídolos em crepúsculo.

Era um riso que vinha da própria escada.

Ser e escada: síntese em unidade.

Uma escada que ria.


A escadaria.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Concrecoisa Zen Meu Bem


A Concrecoisa Zen Meu Bem retoma o tema zen na vida das pessoas.

Lembro que tratei a coisa zen na Concrecoisa Zen Fez Bem, publicada em 24 de agosto deste ano de 2013.

Na Concrecoisa Zen Fez Bem surgiu a seguinte equação:

Fez+Bem+Ser+Zen+Meu+Bem=Felicidade

E agora na Concrecoisa Zen Meu Bem, qual seria a equação?

Sinceramente, não tenho resposta, pois nem tudo na vida tem uma equação e nem tudo tem uma resposta.
O estado zen, ao remeter à condição de cada pessoa, pode ter ou não ter uma equação.

Zen meu zen
Zen meu zen
Bem...
Vem
Ver
Seu Zen, zen, zen
Vem ver

Ao ler o que diz a concrecoisa imitando a forma humana, só posso reafirmar que a coisa zen é tudo aquilo que o dinheiro não pode comprar.

Se é zen, está tudo bem!


Então vem ser zen também. 

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Concrecoisa Aguóleo


O aguóleo é a mistura da água com o óleo.
Dizem que água e óleo não se misturam. É senso comum.


Discordo e explico, aqui na Concrecoisa Aguóleo, rapidinho, pois, no dia de hoje cada vez mais veloz, os textos longos causam sérias rejeições.


Mesmo com densidades diferentes, o óleo e a água formam unidade líquida quando estão em processo de mistura.


Com a água parada, o óleo sobe, ele boia, pois é menos denso do que a água.


Mas pode acontecer de a água estar sendo batida, em movimento, como num liquidificador. Neste instante, as moléculas da água e do óleo se misturam formando uma coisa aquosa.


Se o liquidificador ficar batendo infinitamente, água e óleo estarão misturados infinitamente.


Aí está a possibilidade que não querem enxergar.


É bom lembrar que processos de misturas podem ser dinâmicos, como são dinâmicos os movimentos dos astros, das marés, das moléculas e das coisas que detestam o que é estático.


Se não deu para entender, não se estresse e continue acreditando que água e óleo não se misturam. 


Não brigaremos por isso!

Ponto de vista é ponto de cada vista.


E a vida segue misturando ou não água e óleo.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Concrecoisa Muitinformação


Viver neste mundo cibernético, hiperveloz, significa viver bombardeado de informação, muita informação.

No meio do tiroteio informativo fica o jornalista, alimentador deste mundo caótico.

O mais interessante de tudo isso ocorre quando deixamos de lado vários 'pratos de notícias' e percebemos que, sem estes pratos, a vida muda para melhor e sem matar ninguém.

Cada vez mais é preciso saber cada vez mais, que é preciso saber mais e cada vez mais e mais e mais e mais...

Ufa!

Falando nisso, vocês sabiam que os cientistas albaneses descobriram uma partícula modificadora da estrutura atômica dos materiais, em Alfa de Centauro, e com a descoberta será possível transformar um grão de areia em dez gramas de ouro?

Vocês sabiam que os cabelos dos astros do cinema americano são lavados com água das profundezas abissais do polo sul e com algas marinhas da costa leste dos EUA?

Muita informação acaba gerando muitinformação e desinformação.

Uma coisa que merece registro, pois estou findando o texto: este tema foi sugerido pelo colega e amigo jornalista Osvaldo Lyra, que não cansa de dizer: “É muita informação!”.

Concordo plenamente, ainda mais quando somos fisgados por inquietantes “notícias/informações” bestiais.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Concrecoisa Possibilidades



As possibilidades pertencem ao mundo das coisas acreditáveis, ou não.

Uma coisa é ou não é uma coisa...

É sim ou não.

É claro ou escuro.

É vida ou morte.

É doce ou salgado.

É bom ou mau.

É bem ou mal.

É colorido ou preto e branco.

É... ou...

Mas, porém, contudo, todavia, ainda assim, entretanto...

Duas coisas são e não são ao mesmo tempo.

Essa possibilidade existe dentro das possibilidades.

É algo para se pensar e acreditar com atenção.

Sim e não existem ao mesmo tempo em uma situação que faz a possibilidade conviver com a impossibilidade.

Este entre-lugar é ao mesmo tempo o céu e o inferno, quando surge na linha do horizonte o cinza entre o branco e o preto.

Não se assuste pessoa se eu lhe disser que tudo não passa de inquietantes possibilidades.