sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Concrecoisa Traça



Era uma vez uma traça.

Ela vivia na biblioteca pública passeando por entre os livros.

Ela amava as obras clássicas.

No setor de filosofia, se deliciava com os filósofos gregos, preferindo Sócrates e irritando-se com os sofistas.

Gostava também de outros filósofos, como o dinamarquês Kierkegaard e o alemão Nietzsche.

Certo dia, uma traça que não lia soube da boca de outra traça que se uma traça fraca tomar veneno, pouco a pouco e em dose não mortal, o veneno tornar-lhe-á mais forte.

Assim fez a traça que não lia, que passou a lamber as naftalinas da biblioteca.

Começou com uma lambidinha medrosa, passando para duas, três e assim por diante.

Só que um dia, se achando poderosa demais, a traça que não lia abusou da lambida e acabou mordendo um pedaço da bolinha de naftalina.

Morreu em poucos segundos.

A traça mais velha, aquela que passeava por entre os livros e lia tudo com aprofundamento e interpretava o que estava nas entrelinhas, disse repetidas vezes para uma traça jovem que iniciava a vida.

– Traça feliz não come naftalina.

– Traça feliz não come naftalina.

– Traça feliz não come naftalina.

– Traça feliz não come naftalina.

– Traça feliz não come naftalina.

...

Tempos depois, já bem velhinha e no leito de morte, a traça que aprendera que “traça feliz não come naftalina” pediu como último desejo comer um pedacinho da bolinha de naftalina.

Em segundos, vendo que antecipara a morte, nas últimas palavras, disse para todas as traças que estavam ao seu lado:

 – Traça feliz só come naftalina no seu último desejo.

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